Refluxo e azia são problemas genéticos?

Refluxo e azia são problemas genéticos?

A causa exata do refluxo gastroesofágico não é totalmente conhecida, mas algumas bebidas como refrigerantes, café e alcóolicas, estresse e diversos alimentos podem piorar o quadro, que tem influência de marcadores genéticos, segundo estudos

Problema digestivo bastante comum, o refluxo gastroesofágico ocorre quando o ácido do estômago volta para o esôfago, causando uma sensação de queimação no peito. É por isso que o refluxo ácido é comumente chamado de azia. “A maioria das pessoas apresenta refluxo ácido apenas ocasionalmente. No entanto, algumas pessoas têm refluxo ácido mais de duas vezes por semana. Esta forma crônica de refluxo ácido é chamada de doença do refluxo gastroesofágico (DRGE). Há evidências abundantes mostrando uma ligação entre nossos genes e o refluxo ácido. Estudos em pessoas com sintomas da doença identificaram marcadores comuns em nosso DNA associados ao refluxo”, afirma o geneticista Dr. Marcelo Sady, Pós-Doutor em Genética e diretor geral da Multigene, empresa especializada em análise genética e exames de genotipagem. “Essa doença é séria e pode levar a problemas graves de saúde se não for tratada. Os principais sintomas incluem: sensação de queimação no peito; regurgitação; eructação; dificuldades de deglutição; dores abdominais; é comum os pacientes sofrerem com náuseas, vômitos, indigestão e flatulência”, completa a médica nutróloga Dra. Marcella Garcez, diretora e professora da Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN).

Segundo a médica, o refluxo ocorre quando o músculo no final do esôfago (o esfíncter esofágico inferior) não fecha com força suficiente. “Esse músculo deve abrir por um período muito curto de tempo quando você engole. Se não fechar corretamente ou relaxar com muita frequência, o suco gástrico e o conteúdo do estômago podem voltar para o esôfago”, afirma a Dra. Marcella. A causa específica da doença ainda não é determinada, mas ela sofre influência genética e piora em situações estressantes e por hábitos alimentares. “Comer grandes volumes em uma refeição ou muito rápido, além da ingestão de bebidas gaseificadas, café, álcool e ainda o consumo de certos alimentos, agravam o problema. A lista de alimentos que merecem cuidado é grande e inclui: alho, cebolas, comidas fritas, alimentos ricos em gordura, laticínios, alimentos picantes, tomates, chocolates e depende de fatores individuais”, diz a médica.

Uma das melhores maneiras de estudar a ligação entre uma condição específica e a genética é pesquisá-la em gêmeos. “Gêmeos idênticos compartilham o mesmo DNA. Se os dois gêmeos tiverem uma doença específica, é provável que haja uma causa genética. Um estudo publicado na revista Alimentary Pharmacology & Therapeutics descobriu que os gêmeos eram mais propensos a ter a doença. O estudo incluiu 481 gêmeos idênticos e 505 gêmeos fraternos. A correlação foi mais forte em gêmeos idênticos em comparação com gêmeos fraternos. Isso sugere que a genética desempenha um papel na causa do refluxo ácido”, explica o geneticista Dr. Marcelo Sady.

Um estudo anterior publicado na revista Gut descobriu que um gêmeo tinha 1,5 vezes mais probabilidade de sofrer de refluxo se seu gêmeo idêntico tivesse a doença. O estudo comparou a incidência de azia em mais de 2.000 pares de gêmeos idênticos. “Os genes desempenham um papel na causa de problemas musculares ou estruturais no estômago ou esôfago que levam ao refluxo ácido”, conta o geneticista.

Pesquisa na Universidade de Amsterdã encontrou um padrão de herança genética da doença entre membros de famílias multigeracionais. Dos 28 membros da família que participaram do estudo, 17 membros de quatro gerações foram afetados pelo refluxo. No entanto, os pesquisadores não conseguiram identificar o gene específico. “Já outro estudo, este publicado no Nature Genetics encontrou variantes genéticas específicas nos cromossomos 6 e 16 associadas a um risco maior de problemas gastroesofágicos. O estudo descobriu que o gene que codifica a proteína mais próximo a essas variantes é o FOXF1, que está conectado ao desenvolvimento e à estrutura do esôfago”, explica o geneticista. Um estudo publicado no American Journal of Gastroenterology descobriu que um polimorfismo específico (uma variação no DNA) chamado GNB3 C825T estava presente em todos os 363 pacientes com refluxo incluídos no estudo. A variação genética, por outro lado, não estava presente na população de controle saudável do estudo, o que sustenta a hipótese.

No entanto, mesmo que nossos genes sejam responsáveis por causar o refluxo, são os hábitos de vida que ajudarão a prevenir e tratar os sintomas da doença, segundo o geneticista. “Pessoas com a doença do refluxo gastroesofágico precisarão de tratamento contínuo e de longo prazo. Sem tratamento, o risco de complicações graves é muito maior. Podem ocorrer complicações sérias se o refluxo não for controlado por mudanças no estilo de vida ou medicamentos. Na maioria dos casos, as modificações no estilo de vida podem ajudá-lo a controlar episódios ocasionais de refluxo ácido”, diz o geneticista. “Entre as principais mudanças, está a adequação do plano alimentar, evitando alimentos e bebidas que fazem a azia piorar. Os culpados comuns são: café, chocolate, bebidas gaseificadas. Em muitos casos perder peso, parar de fumar e evitar comer antes de dormir são orientações importantes”, explica a Dra. Marcella. “No entanto, é importante enfatizar que, mesmo que o refluxo tenha uma causa genética e seja tratado com medicamentos, a mudança no estilo de vida se faz necessária para prevenir o agravamento dos sintomas e complicações posteriores”, finaliza o Dr. Marcelo Sady.

Fontes:
*Dr. Marcelo Sady: Pós-doutor em genética com foco em genética toxicológica e humana pela UNESP- Botucatu, o Dr. Marcelo Sady possui mais de 20 anos de experiência na área. Speaker, diretor Geral e Consultor Científico da Multigene, empresa especializada em análise genética e exames de genotipagem, o especialista é professor, orientador e palestrante. Autor de diversos artigos e trabalhos científicos publicados em periódicos especializados, o Dr. Marcelo Sady fez parte do Grupo de Pesquisa Toxigenômica e Nutrigenômica da FMB – Botucatu, além de coordenar e ministrar 19 cursos da Multigene nas áreas de genética toxicológica, genômica, biologia molecular, farmacogenômica e nutrigenômica.

*Dra. Marcella Garcez: Médica Nutróloga, Mestre em Ciências da Saúde pela Escola de Medicina da PUCPR, Diretora da Associação Brasileira de Nutrologia e Docente do Curso Nacional de Nutrologia da ABRAN. A médica é Membro da Câmara Técnica de Nutrologia do CRMPR, Coordenadora da Liga Acadêmica de Nutrologia do Paraná e Pesquisadora em Suplementos Alimentares no Serviço de Nutrologia do Hospital do Servidor Público de São Paulo.

Imagem: Freepik