Obesidade: um distúrbio metabólico muito comum

Obesidade: um distúrbio metabólico muito comum

Está comprovado que a obesidade tem um alto grau de correlação com o aumento na patologia de diversos órgãos e sistemas: doenças cardiovasculares, diabetes, alterações da vesícula biliar, artrite, gota, alterações da função pulmonar e certos tipos de câncer

O que se entende por obesidade?

A obesidade é uma alteração multifatorial complexa caracterizada por um excesso de tecido adiposo, causado por um desequilíbrio entre o suporte nutricional e o gasto energético.

As definições com base no peso corporal são arbitrárias, já que o peso nem sempre reflete exatamente a proporção relativa de tecido adiposo no corpo ou de massa adiposa total. O peso de acordo com a altura corporal constitui um melhor índice em comparação com o peso isolado e, com base nisso, o cálculo do índice de massa corporal (IMC), que resulta na proporção em peso (kg)/altura (m)2:

Sobrepeso: IMC 25-29,9
Obesidade de grau I: IMC 30-34,9
Obesidade de grau II: IMC 35-39,9
Obesidade de grau III: IMC ≥ 40

À semelhança de todas as medidas que incluem o peso, o IMC tem a desvantagem de não discriminar os diversos compartimentos corporais: esquelético, adiposo e proteico ou muscular, já que uma pessoa pode pesar mais por apresentar uma maior massa muscular. Esse é um exemplo claro que fica em evidência em atletas. Apesar dessas limitações, diversos estudos em populações não selecionadas demonstraram que as variações da gordura corporal explicam mais de 90% das variações do IMC e, por isso, são um excelente indicador de obesidade.

Distribuição da gordura corporal

Nos últimos anos, deu-se especial ênfase na distribuição da gordura corporal mais que na intensidade global da obesidade. Portanto, a obesidade foi classificada de acordo com a distribuição do tecido adiposo em:

Tipo I: obesidade generalizada
Tipo II: obesidade tronco-abdominal subcutânea ou androide
Tipo III: obesidade abdominal visceral
Tipo IV: obesidade gluteofemoral, ginoide ou periférica

Os tipos II e III referem-se aos pacientes obesos em que o excesso de gordura é localizado de preferência nas regiões do tronco e do abdome, por isso, juntos são chamados de obesidade central, em contraste com o tipo IV ou obesidade periférica.

Dependendo de onde está localizado o excesso de tecido adiposo, diferentes formas ou tipos de obesidade são reconhecidos.

Problemas associados com a obesidade

As complicações para a saúde derivadas da obesidade foram trazidas à luz, pela primeira vez, por empresas de seguros de vida norte-americanas, que observaram uma correlação entre o grau de obesidade e a mortalidade em estudos realizados em populações de classe média.

Estudos posteriores demostraram que essa mortalidade elevada é devida a um aumento na patologia de diversos órgãos e sistemas: doenças cardiovasculares, diabetes, alterações da vesícula biliar, artrite, gota, alterações da função pulmonar e certos tipos de câncer.

Por sua vez, sabe-se que o risco associado com a obesidade é mantido, mesmo que outras variáveis, como a pressão arterial e o colesterol, por exemplo, que também incidem sobre a mortalidade, sejam controladas.

Todos os estudos publicados indicam que o risco é maior quanto maior for a obesidade, expressa pelo IMC. Considera-se obesidade de classe I o IMC entre 30 e 34,9, obesidade de classe II para IMC entre 35 e 39,9 e obesidade de classe III para IMC maior ou igual a 40.

Alterações nos lipídios. Em pessoas obesas, as anormalidades lipídicas observadas consistem em um aumento do colesterol total e dos triglicerídeos. Observa-se um aumento do chamado “colesterol ruim” (VLDL e LDL) e uma diminuição do “colesterol bom” (HDL), combinação que favorece o desenvolvimento de aterosclerose no interior dos vasos sanguíneos. O aumento dos níveis de colesterol total, assim como os de triglicerídeos, foi observado como relacionado com um risco elevado de doença coronária.

Alterações na glicemia e diabetes. A obesidade, principalmente a central, é o fator ambiental etiológico mais diretamente relacionado com o aparecimento do diabetes. O risco de diabetes aumenta com o grau de obesidade, sua duração e a distribuição central da gordura corporal. O ganho de peso precede o aparecimento do diabetes e aumenta os requerimentos de insulina pelo organismo.

Distúrbios respiratórios. Há uma grande variedade de alterações pulmonares em pacientes obesos. A disfunção pulmonar é frequente, por uma alteração na musculatura respiratória pela reserva de gordura subcutânea e aumento do trabalho respiratório.

Além disso, em pacientes muito obesos, especialmente homens, ocorrem também apneias do sono: a respiração do paciente é obstruída durante o sono devido a um colapso da via aérea superior, o que faz com ele acordar repetidamente durante a noite. A consequência é dormir mal e, durante o dia, apresentar vários distúrbios por falta de descanso. Por exemplo, a apneia do sono está associada com um risco elevado de sofrer acidentes de trânsito.

Distúrbios cardiovasculares. A obesidade, especialmente a central, aumenta o risco de doenças cardiovasculares tanto em homens quanto em mulheres, incluindo infarto do miocárdio, hipertensão arterial, acidente vascular cerebral (“ataque cerebral” ou “AVC”), arritmias e morte súbita.

Tumores. Os pacientes obesos têm um maior risco de desenvolver certos tumores. Geralmente aumenta a frequência de câncer de vesícula e vias biliares, de mama (na menopausa), de ovário, de colo uterino e de endométrio entre as mulheres obesas. Este último é observado em mulheres obesas seja qual for a faixa etária, tanto assim que as mulheres com um excesso de peso de 40% quadruplicaram a frequência de câncer endometrial.

Em mulheres na menopausa com um excesso de peso de 40% ou superior, a frequência de câncer de mama aumenta em 1,53 vez. Esse aumento refere-se à menopausa, pois é nessa etapa que predomina o efeito do excesso de estrógenos produzidos no tecido adiposo que age sobre os receptores de estrógenos da mama, sem encontrar o efeito protetor exercido pela progesterona, que é o hormônio presente nas mulheres férteis.

Os homens obesos têm maior risco de câncer retal e de próstata. O mecanismo que aumenta a frequência de câncer de próstata é desconhecido. Um excesso de peso de 20% ou mais aumenta a frequência do câncer de próstata em 20%-30%.

Em ambos os sexos, aumenta a frequência de câncer de rim e de cólon.

Alterações articulares. A artrose está significativamente aumentada na obesidade, afetando os joelhos e tornozelos. Isso pode ser devido às articulações que devem suportar o excesso de peso corporal.

Não obstante, a maior frequência de artrose também observada em outras articulações que não suportam peso sugere que há outros componentes da obesidade que alteram a cartilagem e o metabolismo ósseo independentemente do peso. Outros distúrbios osteoarticulares relacionados com o excesso de peso são: hérnias de disco, gota e problemas no quadril (necrose avascular da cabeça do fêmur).

Distúrbios digestivos. Os distúrbios digestivos incluem refluxo gastroesofágico, fígado gorduroso e cálculos biliares.

No caso do fígado gorduroso, o transtorno não causa sintomas e é geralmente diagnosticado em alterações laboratoriais e/ou ecográficas.

O colesterol é normalmente excretado na bílis. O excesso de colesterol observado em obesos pode levar à formação de cálculos biliares. Como consequência, as pessoas com um excesso de peso de 50% mostram uma probabilidade até seis vezes maior de formação de cálculos.

Distúrbios renais. As glomerulopatias renais que estão relacionadas com a obesidade são litíase (cálculos), incontinência urinária e glomerulopatias.

Distúrbios neurológicos. Neste campo, em relação com a obesidade, foram descritos acidentes vasculares cerebrais, hipertensão intracraniana idiopática e pseudotumor cerebral.

Distúrbios dermatológicos. Vários distúrbios na pele estão associados com obesidade: estrias, acantose nigricans (pigmentação escura ao redor do pescoço, juntas, cotovelos e joelhos), mais pelos no corpo e intertrigo (infecções micóticas nas dobras).

Distúrbios gineco-obstétricos. As alterações no sistema reprodutivo da mulher estão entre as mais importantes das relacionadas com a obesidade. As menstruações irregulares são as mais comuns e os ciclos anovulatórios são os mais frequentes. A fertilidade pode estar reduzida.

Em grávidas, a obesidade está associada a um aumento na frequência de hipertensão e toxemia da gravidez, diabetes gestacional, gravidez múltipla, anemia e morte fetal. Também aumenta a duração do parto e a frequência de partos múltiplos e partos por cesariana.

Maior risco cirúrgico. Os pacientes obesos apresentam mais frequentemente complicações anestésicas relacionadas com as alterações na função pulmonar. No pós-operatório, tais alterações exigem necessidade de respirador com maior frequência e, por sua vez, a desconexão do respirador requer mais tempo que em pacientes com peso normal. Um exemplo dos problemas cirúrgicos que os obesos apresentam é o dobro de mortalidade em intervenções por apendicite.

Esses pacientes também apresentam maior incidência de atelectasias, pneumonia e tromboembolia pulmonar no pós-operatório. Os pacientes obesos também têm um risco elevado de trombose venosa dos membros inferiores após a cirurgia.

Nesses pacientes, um agravamento na cicatrização das feridas foi descrito, com aumento da frequência de infecções. Além disso, os tecidos com gordura abundante são mais frágeis, fáceis de lesionar e difíceis de suturar.

Distúrbios do metabolismo de fármacos. A obesidade está associada com as alterações fisiológicas que modificam a distribuição, o metabolismo e a excreção renal de fármacos, tais como sedativos, antiepilépticos, antiarrítmicos, anestésicos, anticoagulantes e alguns antibióticos.