O tabaco e as vias respiratórias
A fumaça do cigarro pode afetar de forma grave a saúde de todos os indivíduos, mesmo daqueles que não fumam. O que a fumaça do tabaco produz nas vias respiratórias?
É sabido que fumar é nocivo para a saúde. Está impresso em letras grandes nos maços de cigarro, limita-se fortemente a publicidade a respeito e todos conhecem algum caso próximo de doença pulmonar (principalmente câncer), infartos cardíacos ou cerebrais e inclusive alguma amputação de membro por causa desse hábito. No entanto, a dependência é insuperável naqueles fumantes severos.
Quais os danos do tabaco? Por que um fumante se torna dependente? A fumaça do cigarro possui não menos que 4.000 substâncias tóxicas, teratogênicas e carcinogênicas. As substâncias mais importantes são a nicotina (alcaloide que gera dependência) e dois grupos carcinogênicos: N-nitrosaminas e hidrocarbonetos policíclicos aromáticos, que abarcam entre si cerca de cinquenta moléculas cancerígenas. Estas substâncias são as que atuam de forma deletéria sobre o epitélio bronquial, de tal modo que, com o passar dos anos, são produzidas modificações no material genético de tais células, adquirindo-se assim potencial de malignização. Entretanto, numerosas substâncias tóxicas da fumaça do cigarro atuam de maneira direta sobre os brônquios, provocando irritação crônica e lesões que com o tempo tornam-se irreversíveis. Por fim, outras substâncias resultam teratogênicas, ou seja, os futuros filhos de fumantes grávidas estão propensos a desenvolver malformações congênitas.
Efeitos do tabagismo nos pulmões
Ao fumar, o indivíduo introduz a fumaça tóxica diretamente nos pulmões, e obviamente esses são os órgãos que primeiro acusam tal agressão. O tabagismo crônico, em especial quando são consumidos muitos cigarros diariamente, leva inexoravelmente a uma deterioração pulmonar crônica, que, no “melhor” dos casos, acabará desenvolvendo a chamada doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e muitas vezes derivará o temido câncer de pulmão.
A DPOC é uma doença do adulto mais velho e idoso produzida quase que exclusivamente pelo tabaco (90% dos casos). É a quinta causa de morte no mundo. Consiste em uma limitação do fluxo aéreo pulmonar causada pela inflamação crônica nos pulmões produzida pela fumaça do cigarro no decorrer dos anos. Com o tempo, produzem-se uma bronquite crônica e o enfisema pulmonar, elementos característicos da DPOC. O tórax se expande e os ruídos respiratórios à ausculta diminuem. O paciente percebe que pouco a pouco vai perdendo capacidade respiratória, agitando-se cada vez mais diante de esforços menores; além disso, apresenta tosse produtiva e crônica (“tosse de fumante”). O tratamento inicial, logicamente, consiste em parar de fumar, ainda que as lesões costumem ser irreversíveis. Outras medidas complementares são o uso de mucolíticos, fisioterapia respiratória, antibióticos nas intercorrências infecciosas e, em casos graves, o uso de oxigênio de forma contínua.
O câncer de pulmão é a primeira causa de mortalidade por câncer no mundo, tanto em homens como em mulheres. A cada ano surgem mais de um milhão de novos casos. É um tumor altamente letal: no melhor dos casos, 14% dos pacientes atingem uma sobrevida de cinco anos após o diagnóstico. Em 90% das vezes, o tabaco é a causa direta da referida doença (fumantes ativos). É um dos poucos cânceres a ter um fator causal tão concreto e bem estudado. Sabe-se que fumar até 20 cigarros diários multiplica por dez a possibilidade de desenvolver câncer de pulmão, enquanto fumantes mais severos (mais de 20 cigarros diários) chegam a multiplicar por vinte tal possibilidade. Esses números são tão contundentes que, apesar dos esforços das indústrias tabagistas para minimizá-los, torna-se impossível diminuir sua importância.
Embora existam vários tipos de câncer de pulmão, os mais frequentes – e relacionados ao tabagismo – são o adenocarcinoma, o carcinoma basocelular e o carcinoma de grandes células. Existe um quarto tipo de pouca frequência chamado carcinoma de pequenas células, de comportamento diferente e não relacionado ao tabagismo. Os três primeiros têm um comportamento similar com respeito à clínica, ao tratamento e ao prognóstico.
A descoberta produz-se no contexto de um paciente em geral fumante severo e de vários anos de evolução no hábito, com deterioração do estado geral e tosse que pode ser sanguinolenta. Com frequência, uma simples radiografia de tórax mostrará a presença do tumor; se não for assim, a tomografia e/ou a broncoscopia podem ajudar a localizar a suspeita de câncer. O tratamento é eminentemente cirúrgico, somado, conforme o caso, à quimioterapia ou radioterapia.
O que acontece com os fumantes passivos?
Muito se tem falado dos efeitos deletérios do tabaco nas pessoas que não fumam, mas inalam a fumaça de outros fumantes confinados no mesmo ambiente (laboral, estudantil etc.).
Sabe-se há algum tempo que o fumante passivo também está exposto a graves riscos à saúde. Nos Estados Unidos, morrem 53.000 pessoas por ano por causa do cigarro; e a cada oito fumantes ativos, morre também um fumante passivo, ou seja, um indivíduo que nunca fumou, mas teve que suportar o assédio do fumo em seu convívio diário. Cabe destacar, entre centenas de estudos científicos a respeito, um realizado sob o mais absoluto sigilo por uma importante companhia tabagista mundial já na década de 80 do século XX, no qual foi demonstrado que a fumaça inalada pelo fumante passivo é quatro vezes mais tóxica e entre duas e seis vezes mais cancerígena que a fumaça tragada “de primeira mão”. Esses resultados tornaram-se públicos e são muito alarmantes.
A única solução consiste no estabelecimento de leis duras (e advogar por seu cumprimento) a respeito da proibição de fumar em edifícios públicos, escritórios, locais de alimentação; enfim, todo lugar onde as pessoas, muitas das quais não fumam e, sem dúvida, não merecem ser intoxicadas pelos fumantes ativos, se reúnam para as mais diversas atividades.