O diabetes e a obesidade

O diabetes e a obesidade

De forma paralela ao aumento da incidência da obesidade, o diabetes mellitus tipo 2 mostra também alarmantes cifras crescentes

Considera-se que a incidência do diabetes esteja aumentando de forma geométrica e que, até 2025, as pessoas afetadas superarão os 250 milhões. Como consequência desse fato, a mortalidade cardiovascular vem ocorrendo em grupos populacionais muito mais jovens. É que a obesidade e o diabetes tipo 2 fazem parte da síndrome plurimetabólica de resistência à insulina, que foi considerada pelo ATP III (Adult Treatment Panel III ou Painel de Tratamento III do Adulto) como um importante determinante de risco cardiovascular em cuja constelação de sintomas a dislipidemia ocupa um lugar de destaque. A chamada síndrome metabólica reúne toda uma série de doenças e anormalidades comumente inter-relacionadas, que aparecem em um mesmo indivíduo com uma frequência que supera amplamente a probabilidade estatística e que, além disso, tem a característica comum de aumentar por si só a possibilidade de desenvolver aterosclerose. Dentre as doenças e anormalidade, incluem-se: intolerância à glicose, diabetes, dislipidemias, obesidade abdominal-visceral e hipertensão arterial.

O tipo de alteração lipídica encontrada nessa síndrome é a hiperlipidemia combinada, ou seja, algum grau de hipercolesterolemia e hipertrigliceridemia associadas. Considera-se que a resistência à insulina é um fator-chave para a expressão deste fenótipo de hiperlipidemia combinada, a qual se encontra acompanhada por diversos fatores de risco como obesidade abdominal ou centrípeta, baixas concentrações de colesterol HDL, aumento de colesterol LDL (em especial de partículas pequenas e densas de LDL), hipertensão arterial, resistência à insulina e diabetes ou ao menos a diminuição da tolerância à glicose, hiperuricemia e um estado pró-inflamatório e pró-trombótico.

Aqueles que sofrem da síndrome plurimetabólica estão expostos a um risco cardiovascular realmente aumentado e 10%-15% deles apresentam doença coronariana precoce. Com o aumento da idade, do IMC (Índice de massa corporal) e da adiposidade, a sensibilidade à insulina diminui e o número de fatores de risco cardiovascular aumenta, tanto para homens como para mulheres.

A síndrome plurimetabólica inclui uma série de fatores inter-relacionados que têm a característica de aumentar o risco de desenvolver aterosclerose.

O diabetes tipo 2

O diabetes é um dos principais fatores de risco predisponentes à aterosclerose coronária, já que acelera sua progressão, produz uma disfunção endotelial e aumenta a atividade plaquetária. Todos os dados epidemiológicos assinalam que 75% dos eventos mortais nos diabéticos são devidos a doença cardiovascular, e, por sua vez, 75% deles têm como base específica a doença coronariana. O diabetes, efetivamente, elimina a proteção associada ao sexo feminino para o aparecimento de coronariopatia.

A incidência e a mortalidade por doença coronariana e outros eventos relacionados à aterosclerose aumentam com a idade em ambos os gêneros, em especial durante a sexta década de vida; e, ainda que sejam muito menos frequentes na mulher pré-menopáusica, passada a menopausa, a incidência da síndrome metabólica e a mortalidade cardiovascular se incrementam até igualarem-se aos algarismos masculinos. Especificamente do ponto de vista do perfil lipídico, o tipo de hiperlipidemia que os obesos e os diabéticos tipo 2 evidenciam (triglicérides elevados, aumento de partículas densas e pequenas de LDL e redução de c-HDL) constitui a denominada “hiperlipidemia aterogênica”. De maneira típica, essa tríade lipídica ocorre em pessoas com doença coronariana prematura e naquelas em que coincidem características como obesidade do tronco, resistência à insulina e sedentarismo.

Os resultados de algumas metanálises demonstraram que a hipertrigliceridemia poderia ser um fator de risco cardiovascular independente e que algumas lipoproteínas ricas em triglicérides têm grande poder aterogênico. As de maior importância seriam as “lipoproteínas remanescentes”, que incluem as pequenas VLDL e as lipoproteínas de densidade intermediária (Intermediate Density Lipoproteins – IDLs), partículas ricas em colesterol e que podem possuir em comum muitas das características das LDL.

A localização mais perigosa da gordura corporal

A obesidade é um fator de risco tanto para a presença de resistência à insulina como para o desenvolvimento de diabetes tipo 2, já que contribui para gerar e perpetuar as alterações no metabolismo dos carboidratos. Calculou-se que a obesidade é 2 a 4 vezes mais frequente entre os diabéticos, e que, por sua vez, o risco de sofrer de diabetes é 3 a 4 vezes maior nos obesos que nos sujeitos de peso normal.

O IMC é calculado dividindo-se o peso pelo quadrado da altura do indivíduo; é fácil de obter e de grande utilidade para definir clinicamente a obesidade. À medida que aumenta o IMC, a sensibilidade à insulina diminui e o controle metabólico vai piorando. Quando seu valor é maior do que 28, o risco de diabetes, coronariopatia isquêmica e derrame ou ataque cerebral triplica ou quadruplica, em relação àquele da população geral; o risco aumenta 25% para cada nova unidade de IMC. De maneira inversa, a redução do peso em 10% a 20% se associa a uma melhoria marcante na glicemia e na sensibilidade à ação da insulina em pacientes diabéticos obesos.

Tanto a magnitude do incremento de peso corporal como a duração do tempo de sobrepeso e fundamentalmente a localização do tecido adiposo corporal são fatores de risco para desenvolver diabetes e doença cardiovascular.

A distribuição da gordura com predomínio na zona abdominal (obesidade do tronco, ou do tipo androide, com aspecto corporal de “maçã”) constitui um fator que predispõe ao desenvolvimento de diabetes e está associada, além disso, a dislipidemia e hipertensão. Em especial nas mulheres, detectou-se uma forte correlação negativa entre a acumulação de gordura intra-abdominal e a sensibilidade à insulina.

Sugere-se que, quando o perímetro da cintura é maior que 94 cm nos homens e maior do que 80 cm nas mulheres, aparecem as modificações desfavoráveis no metabolismo dos carboidratos e dos lipídeos. Valores de 102 e 88 cm, respectivamente, estão, por sua vez, associados a risco cardiovascular e são considerados cifras indicativas para o diagnóstico de síndrome metabólica. Inclusive naqueles sujeitos que, por seu IMC, apresentam sobrepeso, mas não obesidade (entre 25-30), a circunferência de cintura maior do que 102 cm está associada ao aumento de tensão arterial, triglicérides e lipoproteínas LDL densas e pequenas, muito aterogênicas.

Os estudos populacionais demonstraram uma associação muito forte entre obesidade e dislipidemia, desde idades precoces e que progride com o tempo. Além disso, foi proposto que o sobrepeso corporal pode ser um determinante muito importante da taxa de síntese de colesterol. O estudo Framingham demonstrou que, para cada 10% de aumento do peso relativo, a colesterolemia eleva-se mais de 10 mg/dl. Igualmente ao que ocorre no diabetes, a dislipidemia secundária à obesidade segue o padrão da tríade de alto poder aterogênico: aumento de triglicérides, de LDL densas e pequenas e diminuição de HDL.