Febre de origem desconhecida
Mesmo que, na maioria dos casos, esse distúrbio esteja associado a um processo infeccioso subjacente, é importante realizar um estudo
completo para determinar sua causa.
A febre, um dos sintomas mais frequentes no consultório médico, geralmente é causada por doenças banais e tem curta duração, resolvendo-se com ou sem tratamento. A maioria dos processos febris é diagnosticada levando em consideração os sintomas acompanhantes e através de um exame físico completo.
Ocasionalmente, é necessário realizar um exame completo de sangue ou urina para estabelecer o diagnóstico definitivo. As doenças virais, como infecções do trato respiratório superior, representam a maioria das condições febris que, em geral, são autolimitantes e desaparecem dentro de 2 semanas. Quando a febre persiste, é necessária uma extensa investigação que permita determinar o diagnóstico. Embora alguns casos de febre persistente estejam correlacionados com a presença de doenças graves, na maioria deles, o diagnóstico é rápido, o que permite que o tratamento mais adequado seja aplicado conforme o caso.
Definição e classificações
Os casos em que o profissional de saúde enfrenta um quadro clínico de febre prolongada são cada vez mais comuns. Para fins práticos e de acordo com a definição clássica proposta por Petersdorf e Beeson, a febre de origem desconhecida (FOD) se trata de uma síndrome febril que dura mais de 3 semanas com temperaturas superiores a 38 °C medidas em momentos diferentes, sem chegar a um diagnóstico, após uma semana de estudos realizados no ambiente hospitalar.
A condição de temperatura superior a 38 °C tem como finalidade descartar casos de hipertermia que variam entre 37,3 °C e 37,8 °C, não excedendo 38 °C. O critério de, no mínimo, três semanas de duração permite excluir os processos autolimitantes em um período menor, como a maioria das infecções virais mais frequentes. Finalmente, nos casos de febre de origem desconhecida, sua causa deve permanecer oculta após um interrogatório exaustivo, um exame físico completo, a realização de exames laboratoriais e estudos de diagnóstico por imagens. Somente os quadros clínicos que atendem a essas três condições podem ser rotulados como FOD. Esse tipo de febre tem uma preponderância de origem infecciosa distribuída, em partes quase iguais, entre tuberculose, endocardite bacteriana, infecções urinárias e abscessos intra-abdominais, e aquelas infecções associadas com uma alteração do sistema imunológico, principalmente a infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). Entre as causas não infecciosas mais importantes, destacam-se os tumores (linfomas, carcinomas de órgãos sólidos, como fígado e rim) e colagenopatias (lúpus eritematoso disseminado e vasculite).
Avaliação diagnóstica do paciente com FOD
O diagnóstico do paciente com FOD deve se concentrar no objetivo de conseguir dados ou evidências que sugiram a possível origem da febre, evitando métodos desnecessários e cruentos. Através de um interrogatório detalhado, serão obtidos dados sobre históricos hereditários, pessoais (sintomas associados) e epidemiológicos (viagens realizadas recentemente, local de residência, exposição à tuberculose, contato com animais, local de trabalho, fatores de risco para o HIV e cirurgias recentes). É muito importante investigar sobre a administração de medicamentos, fato que ocasionalmente o paciente nega involuntariamente, como no caso da ingestão de laxantes, analgésicos, anti-hipertensivos, contraceptivos e outros que, devido à sua habitualidade, não são considerados medicamentos. Pode ser necessária a repetição do interrogatório, como também pode ser necessário investigar os membros da família.
Além disso, é necessário fazer um exame físico completo consistindo no exame na pele (procurando a presença de lesões cutâneas) e na cabeça (exame da boca e faringe, dos seios paranasais e exame da visão por meio de um exame do fundo e palpação de artérias temporais). A presença de adenopatias (inflamação dos linfonodos) e sopros cardíacos deve ser verificada. No abdômen, a presença de massas palpáveis ou áreas dolorosas, que possam refletir um abscesso ou tumor intra-abdominal, deve ser verificada. Contudo, é necessário explorar os órgãos genitais e o reto, realizar um exame osteoarticular (para examinar a presença de inflamação e pontos dolorosos) e avaliar o peso corporal e o estado geral do indivíduo. O exame físico, bem como o interrogatório, deve ser repetido diariamente.
Os exames de rotina, laboratoriais e radiológicos, cujos resultados e orientação clínica determinarão a possível solicitação de estudos mais específicos (estudos microbiológicos, sorológicos, imunológicos, de imagem, biópsias e estudos anatomopatológicos) serão solicitados, levando em consideração as possíveis causas mencionadas anteriormente.
No caso em que o diagnóstico tenha chegado e o indivíduo permaneça com febre após a avaliação, há três etapas a seguir:
• Laparotomia exploratória: até alguns anos atrás, a laparotomia exploratória era um procedimento de rotina se o diagnóstico de FOD não fosse encontrado com estudos complementares e na intenção de excluir abscessos e outras patologias intra-abdominais; mas estes podem ser evidenciados com os métodos de diagnóstico por imagens atuais. No entanto, nos casos em que haja clara evidência de patologia abdominal que não pôde ser diagnosticada por outros meios, é imposta a laparoscopia ou a laparotomia.
• Testes terapêuticos: devem ser realizados em último caso e após terem sido esgotados os estudos clínicos, microbiológicos, radiológicos, entre outros. Os testes terapêuticos mais utilizados são o tratamento com antibióticos na suspeita de doença causada por bactérias; o tratamento antituberculoso na suspeita muito provável dessa patologia e, após as coletas das amostras para culturas correspondentes, e os corticosteroides que poderão ser usados nos casos de processos autoimunes, tais como colagenopatias e vasculites.
• Acompanhamento periódico: naqueles casos sem comprometimento da condição geral, a observação está indicada até o desaparecimento da febre ou o aparecimento de novos dados que forneçam informações para chegar ao diagnóstico.