Regurgitação no lactente
A criança que come e regurgita está doente? Os episódios de regurgitação são comuns em lactentes e não implicam necessariamente em uma doença. Conhecer as características desse distúrbio das crianças pequenas permite acalmar a ansiedade das mães e saber se é conveniente procurar um tratamento adequado.
Os bebês geralmente regurgitam quando arrotam ou babam até começarem a comer alimentos sólidos. Isso ocorre quando comem muito ou engolem muito ar ao se alimentar e, involuntariamente e sem esforço, o conteúdo do estômago retorna ao esôfago (parte do aparelho digestivo que liga o estômago à boca). Esse fenômeno, também conhecido como refluxo gastroesofágico (ou simplesmente “refluxo”), geralmente passa despercebido no mesmo bebê, afeta 75% dos bebês lactentes e costuma ser inofensivo. Os fatores que influenciam seu aparecimento incluem imaturidade do sistema digestivo, predominância da posição postural em decúbito (deitado) e alimentação quase exclusivamente líquida.
É importante distinguir refluxo do vômito. Neste último, a expulsão do conteúdo estomacal é forçada, com contração abdominal; além disso, geralmente é acompanhada de náusea e outros sintomas. O vômito pode ter várias causas, desde processos leves (p. ex., birras, más técnicas de alimentação) até doenças graves (p. ex., obstrução intestinal, estenose pilórica hipertrófica, peritonite etc.), por isso, é recomendável evitar a desidratação que acompanha e tratá-la, na medida do possível, resolvendo sua origem.
Quando deixa de ser normal
Embora as regurgitações possam ocorrer várias vezes ao dia durante a amamentação e geralmente desapareçam sozinhas dentro de um ano de vida, o médico deve ser consultado imediatamente quando os seguintes sintomas de alarme aparecerem:
• O bebê não ganha peso.
• Regurgita uma grande quantidade de leite.
• Regurgita ou vomita com força.
• Apresenta náusea.
• Tem vômito com sangue.
• É complicado por sintomas respiratórios (aspiração, falta de ar).
• Aparecem distúrbios de alimentação e/ou deglutição.
• Molha menos fraldas do que o habitual.
• Apresenta cansaço excessivo.
• Volta um líquido marrom ou verde.
• O refluxo persiste além de 18 meses.
É possível que, nessas situações, o profissional indique um tratamento ou solicite estudos complementares para investigar sua causa. Uma das possibilidades é estar lidando com a doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), que ocorre em 1 de cada 300 lactentes. A DRGE pode provocar dor ou dificuldade de comer ou engolir, perda de apetite, nervosismo, vômito com sangue, anemia, falta de ar e crescimento deficiente. Essa doença também pode estar associada à síndrome da morte súbita do lactente e ao “quase afogamento”, a doenças respiratórias crônicas (tosse crônica, pneumonia recorrente, entre outros) e, em crianças maiores, queimação na área do estômago e esôfago e ruminação. Os sintomas da DRGE são idênticos aos causados por alergia à proteína do leite de vaca, cólicas e outros distúrbios, como infecções (principalmente urinárias), alergia a outros alimentos, anormalidades anatômicas, problemas neurológicos, doenças metabólicas e negligência.
O que fazer se houver refluxo?
Quando o lactente regurgita, mas “está feliz”, em bom estado geral e crescimento adequado, não são necessários tratamento ou grandes mudanças em sua alimentação ou cuidado. É importante que a família se acalme e saiba que o refluxo desaparecerá à medida que a alimentação se torne mais sólida e quando o bebê permanecer mais sentado e em pé. Em alguns casos, quando o bico com orifício maior for utilizado para um fluxo alimentar adequado, pode ser recomendado o uso de cereais ou fórmulas com agentes espessantes. Embora isso diminua o número de regurgitações, sua desvantagem é que o alimento em refluxo é mais espesso e leva mais tempo para ser eliminado, o que aumenta a exposição da mucosa do esôfago ao conteúdo ácido.
Quando os sintomas sugerem a suspeita de DRGE, o tratamento procura diminuir a exposição do esôfago ao conteúdo gástrico e prevenir as complicações associadas. Para isso, podem ser implementadas:
– Medidas gerais: incentivar a amamentação, evitar alimentação do bebê e da mãe com leite de vaca ou produtos derivados (para evitar alergia à proteína do leite de vaca) e, nos casos com aumento de peso deficiente, ajustar a frequência (mais) e o volume (menos) das mamadas de leite. Também é recomendável deitar o bebê com a cabeceira do berço levemente levantada.
– Tratamento farmacológico: deve sempre ser indicado pelo médico. Atualmente, o profissional pode escolher entre 5 grupos de medicamentos: inibidores da bomba de prótons (suprimem a secreção de ácido no estômago), antagonistas dos receptores da histamina 2 (diminuem a produção de ácido no estômago), antiácidos (neutralizam a secreção ácida), agentes de barreira (com efeito mecânico para impedir o refluxo do estômago ao esôfago), procinéticos (aumentam o tônus do esfíncter esofágico inferior, um “anel” muscular entre o estômago e o esôfago e melhoram o esvaziamento gástrico).
– Cirurgia: para casos muito específicos. Atualmente, técnicas alternativas estão sendo desenvolvidas através de métodos endoscópicos.
Características da DRGE
Sintomas digestivos
• Regurgitações
• Vômito
• Disfagia (dificuldade de engolir)
• Pirose (queimação no estômago e esôfago)
• Hematêmese (vômitos com sangue)
• Dispepsia (desconforto após comer)
Sintomas extradigestivos
• Falha no crescimento
• Apneia (falta de ar)
• Irritabilidade (nervosismo)
• Cianose (coloração azulada da pele e das mucosas)
• Aspiração pulmonar
• Estridor (ruído característico ao respirar)
• Tosse crônica
• Dificuldade de engolir ou se alimentar